Políticas do despejo, políticas das catástrofes: relatório mostra impactos da Covid-19 sobre povos indígenas
Capítulo sobre o Brasil destaca exemplos dos povos da Volta Grande do Xingu (PA) no combate à doença e as ameaças sobre seus territórios; Debate virtual será realizado na próxima sexta (30)
Ao menos 1048 indígenas e 260 quilombolas morreram vítimas da Covid-19 no Brasil. Estudo destaca ações do povos Juruna (Yudjá) e Mẽbengôkre-Xikrin no enfrentamento da pandemia e das ameaças aos seus territórios. O levantamento “Políticas do despejo, políticas das catástrofes: ameaças socioambientais na pandemia de Covid-19” faz parte do relatório “Rolling back social and environmental safeguards: Global Report”, que contou com o apoio da Forest Peoples Programme. Debate virtual na próxima sexta-feira (30) vai discutir os principais resultados.
O relatório contou com a participação de pesquisadores associados a diversos centros de estudos, como a Lowenstein International Human Rights Clinic Yale Law School, Middlesex University London School of Law e Universidade Federal de São Carlos.
Cover image: Retratos da Resiliência, Manaus, Amazonas, Brasil, 2020
Crédito: FMI / Raphael Alves, Creative Commons
Frente ao colapso sanitário e vulnerabilização de seus territórios, povos indígenas, comunidades tradicionais têm trabalhado junto a organizações da sociedade civil para frear o avanço da doença e os retrocessos nas políticas ambientais e sociais. O relatório traz o exemplo dos povos da bacia do Xingu “com o objetivo de apontar soluções para esses graves problemas que afetam todo o planeta, dado o papel fundamental da Amazônia no combate às mudanças climáticas globais”.
Ameaças e estratégias de resistência
Além da pandemia de Covid-19, os Juruna da Terra Indígena Paquiçamba enfrentam os impactos da hidrelétrica de Belo Monte sobre seu povo e território. O barramento definitivo do rio para a instalação da usina, em 2015, e a consequente diminuição de 80% da vazão do Xingu comprometeu a subsistência do povo, situação agravada com o novo coronavírus.
“De povo auto suficiente, foram colocados em uma posição de extrema vulnerabilidade, tanto em termos de riscos à sua saúde quanto à qualidade de suas vidas, que agora estão ameaçadas pela insegurança alimentar e são cada vez mais negados dos meios de subsistência tradicionais e modos de vida”, denuncia o relatório.
Os Juruna realizam um monitoramento independente da pesca, soberania alimentar e das transformações em seu território, essencial para o dimensionamento dos impactos, e lutando pela implementação de seu protocolo de consulta. “Os Juruna buscam promover a ampliação dos espaços de decisão sobre o futuro de tudo e de todos os envolvidos na região de Volta Grande Xingu. É uma ação de resistência às tentativas de esvaziamento de um território de seu rio e de seus povos que está sendo promovida pela empresa e sancionada por um governo implacável”, diz o texto.
Os indígenas Mẽbengôkre-Xikrin da Terra Indígena Trincheira Bacajá, nas margens do rio Bacajá, enfrentam a explosão do desmatamento e grilagem em seu território, associada ao avanço da Covid-19. Em 2020, mais de 2,6 mil hectares foram desmatados no território dos Xikrin, e só entre janeiro e fevereiro deste ano mais 127 hectares de floresta foram destruídos.
Com o início da pandemia em março do ano passado, e com a redução da vigilância e do monitoramento territorial na região amazônica, as invasões aumentaram na porção sul da Terra Indígena, se aproximando das aldeias.
“Além da perda de biodiversidade devido ao desmatamento, o problema também se tornou uma crise humanitária e de saúde, devido ao risco de contaminação por Covid-19 nas aldeias”. De acordo com o Comitê Interinstitucional, 13 pessoas foram contaminadas em março em aldeias próximas à invasão. Em setembro, o número de pessoas contaminadas saltou para 159. Beptok Xikrin, o cacique Onça, faleceu no final de julho.
Debate virtual acontece na próxima sexta-feira (30)
Na próxima sexta-feira (30) será realizado um debate sobre os principais resultados do relatório. A conversa, mediada pela antropóloga Clarice Cohn, vai contar com a participação de Bel Juruna (Associação Yudjá Mïratu da Volta Grande do Xingu), Tânia Stolze Lima (Universidade Federal Fluminense) e Thais Mantovanelli (UFSCar).
O debate será realizado no dia 30/04 às 18h.